Artigo

O que te aprisiona?

por Graziela Merlina*

Conclui a minha primeira leitura do ano 2020: “A Bailarina de Auschwitz”, de Edith Eva Eger. Ganhei de presente do meu filho no Amigo Secreto da família. Fiquei super feliz com o presente, e com a demonstração do quanto ele me conhece - me deu um presente que é a minha cara.

Foi um daqueles livros que você não quer parar de ler. Parece um roteiro conhecido, mas é cheio de surpresas, principalmente com o desdobramento do futuro da autora. Trata-se da história de uma mulher que viveu e sobreviveu aos horrores da guerra. É um relato de suas memórias e das pessoas que a ajudaram. Tornou-se psicóloga e o livro também traz relatos dos casos de alguns de seus pacientes e a conexão com sua experiência de guerra.

A grande mensagem? Todos nós podemos escapar à prisão de nossa própria mente e encontrar a liberdade.

O que me fez apreciar escrever sobre isso são as diversas vezes onde a autora escolhe enfatizar que não há cura, se não há o sentir. Sua experiência de cura do estresse pós-traumático teve como base seus próprios sentimentos.

“Independente de sua intensidade, sentimentos não são fatais. E eles são temporários. Reprimir os sentimentos apenas os torna mais difíceis de serem resolvidos. A expressão é o oposto da depressão.”

Uau! A expressão é o oposto da depressão. Quanto de cura podemos ter no mundo se cada pessoa, com a sua singularidade e sua liberdade, tivesse a escolha da expressão.

Talvez seja exatamente o oposto do que aprendemos. “Não fica assim – vai passar”; “É melhor não falar sobre sentimentos”; “Vamos racionalizar o problema”; “Chega de sentimentalismo”; etc. Aprendemos a “não expressão”.

E então entramos na era da cura. Cada vez mais vamos ouvir falar sobre isso. Sobre a necessidade de olharmos, de verdade, para as doenças e a toxidade da humanidade e do planeta. E se vamos falar em cura, há que se falar no sentir.

Há um momento em que a autora decidi enfrentar seus medos (só não conto como ela fez isso para não estragar a leitura do livro). E isso só foi possível porque primeiro ela os reconheceu. Expressar o sentimento de medo foi o início da sua cura.

“Este é um trabalho de cura – dar boas vindas ao medo. Você nega o que o machuca, o que teme. Você evita essas coisas de todas as formas. Então você encontra uma maneira de acolher e abraçar o que mais teme e pode finalmente relaxar.”

Há um caminho a ser percorrido. A ser aprendido. Ao qual, a autora deu o nome de Dança da Liberdade.

“Não há um modelo para a cura que sirva para todos, mas existem passos que podem ser aprendidos e praticados, passos que cada individuo pode juntar à sua maneira, passos da dança da liberdade. Meu primeiro passo foi assumir a responsabilidade pelos meus sentimentos. Parar de reprimi-los e evita-los e parar de colocar a culpa em outro... Um mantra para gerenciar as emoções: observar, aceitar, verificar, permanecer... Observar – reconhecer que está sentido algo... Ao nomear o sentimento – aceitar que é seu... Verificar a resposta corporal (calor, frio, coração dispara, respiração, etc.)... Permanecer com o sentimento até que ele passe ou mude.

O segundo passo na dança da liberdade é aprender a correr os riscos necessários para alcançar a verdadeira autorrealização... Correr riscos não significa se jogar cegamente em situações perigosas, mas admitir o seu medo para não ficar preso nele... Fazer o que é certo raramente é o mesmo que fazer o que é seguro.”

Isso me fez pensar (e te convido a pensar também): se temos a liberdade de fazer a escolha da expressão e aprender nosso vocabulário emocional, o que nos aprisiona na escolha de permanecer na dor, na culpa, no sofrimento e no conformismo? Por que escolhemos evitar e não enfrentar nossos medos? Será que é isso que acontece quando as pessoas abandonam suas jornadas – olham pra trás e se lamentam do que podiam ter feito?

“Como é fácil uma vida se tornar uma ladainha de culpa e arrependimento, uma música que continua ecoando o mesmo refrão, a mesma inabilidade de nos perdoarmos. Com que facilidade a vida que não vivemos se torna a única vida que valorizamos. Quão facilmente somos seduzidos pela fantasia de que temos controle, de que algum dia tivemos controle, que as coisas que podíamos ou devíamos ter feito ou dito têm poder, se ao menos as tivéssemos feito ou dito para curar a dor, acabar com o sofrimento, desaparecer com a dor. Com que facilidade podemos nos apegar – venerar – as escolhas que achamos que podíamos ou devíamos ter feito.”

Somos livres para fazermos nossas escolhas a cada momento. Compreender isso é responsabilizar-se pela sua história; é ter a capacidade e o protagonismo de ir ao encontro do que você acredita. É saber que não é possível escolher amor e medo ao mesmo tempo; e que você está sempre escolhendo um deles.

“A ironia da liberdade é a dificuldade cada vez maior de encontrar esperança e propósito.”

E só há esperança e propósito quando escolhemos o amor.

*Graziela Merlina - Idealizadora na @casamerlina / Conselheira no @capitalismoconscientebrasil / Fundadora da @ApoenaRH